quarta-feira, 27 de junho de 2007

Ruínas contemporâneas

Nos anos 60, fascinada com os milagres científicos cotidianos, olhava o livro de matemática e sonhava com o aprendizado instantâneo: uma simples fita passada na cabeça, como quis Huxley, ou gravações suaves durante o sono, como descreveu Asimov. Diante dos procedimentos cirúrgicos, sonhava com o dia em que um simples comando sobre o cerebelo faria o organismo expulsar vírus invasores e liquidar bactérias. Acreditávamos, como Orwell, que seria rápido. Mas 1984 chegou e passou, e o século da ciência foi também o século das guerras.

E, aos poucos, o século XXI se desenha em angústia. O volume de informações disponível é um despenhadeiro de conflitos, uma babel de afirmações. Cuidar da saúde tornou-se uma questão econômica, e o que faz bem, e o que faz mal, assuntos de mercado. Saber tornou-se um dilema: o que? os currículos escolares refletem essa desordem, e os exames de avaliação mostram-se de uma ineficácia cruel.

Mas o século XXI também se desenha em sistemas. As estruturas institucionais clássicas, verticais, piramidais, em forma de espirais ascendentes, estão dando lugar a nós e redes. É fácil visualizar isso numa grande empresa de capital aberto: ninguém tem mais que 2% das ações, e os executivos são empregados de uma multidão. Não são mais o chefe, o boss: são nós de uma teia, cujas regras não lhes permitem hesitações. Pode até haver um centro, mas é um círculo de nós em torno do vazio.

E, como sempre, é do ilegal e do irregular que vem a resposta mais rápida. Hoje, a máfia é assunto nostálgico. A flexibilidade da associação criminosa há muito deixou para trás compromissos e fidelidades: juntam-se três, cometem um crime, e adeus. Qualquer um, em qualquer lugar. A estrutura rígida das instituições verticais, grandes, pesadas, hierarquicamente compostas, vai sendo erodida aos poucos.

Escola são instituições assim. Elas estão ultrapassadas e defasadas. É certo que deve haver um lugar onde deixar as crianças e os adolescentes enquanto os pais contribuem para a produção mundial, mas clássica estrutura escolar está obsoleta. Primeiro, porque é impossível para um professor competir com o mundo de informações disponível na rede de computadores; segundo, porque a hierarquia escolar colide frontalmente com a flexibilidade das relações sociais atual; terceiro, porque a sala de aula tornou-se limitante.

Por exemplo: olho Vênus brilhando no céu e aponto para um menino de cinco anos: “Olha que estrela bonita!” E ele me corrige imediatamente: “Não é uma estrela, é um planeta refletindo a luz do sol.” Nossa conversa, a seguir, foi a que, na década de 80, eu teria com um adolescente: o primeiro ser vivo que foi ao espaço, o primeiro astronauta, o vácuo e as montanhas da lua.

E na escola ele só brinca, desenha e “desenvolve a sociabilidade”...

Escolas são instituições conservadoras por sua própria natureza. Mas as escolas atuais estão sendo esmagadas, erodidas e destruídas. E mesmo os conservadores têm que saber o que conservar e o que descartar. Sob pena de se enterrarem em ruínas, causadas não mais por guerras e bombardeios mas pela simples transformação social.

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