quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O verão do avesso

São seis horas, o sol surge, mas, antes que se veja sua luz, uma rajada de calor anuncia o dia. Pouco depois, o vento frio provoca um arrepio. A luz torna o cinza do céu mais claro, porque não há nenhum retalho de azul: é o primeiro sinal do inverno paraense, o verão do avesso.

A rota da terra diz que agora é verão, mas quem vai chamar verão um semestre de chuvas continuadas? O arrepio de frio não se justifica diante do termômetro, que marca os 28 graus centígrados de todos os dias, às seis. Os nossos tajás, que os demais brasileiros conhecem como tinhorões, apontam as folhas ainda enroladas sobre a terra. Eles são ajustados à órbita da terra: estavam hibernando durante todo o tempo que chamamos de verão, quando o calor dispara os termômetros.

Tudo indica que hoje será o dia da primeira grande chuva de inverno. Toneladas de água condensada estão suspensas sobre nossas cabeças. Dizem que as pirâmides de nuvens sobre Belém chegam à espessura de quilômetros. Eu mesma já vivi a experiência de uma decolagem que parecia interminável, quando o piloto apenas queria varar a camada gigantesca de nuvens.

O verão do avesso é ilusionista. Cria a sensação de frio, quando há calor, a ponto de insetos procurarem o interior quentinho das casas para abrigar-se. Deixa as plantas ajustadas às estações em estado crítico, porque florescem na hora errada. Enche de mofo tudo o que for deixado guardado descuidadamente, provoca soalheiras incandescentes, graças ao ar tornado limpíssimo pela chuva. Agrava todos os males que afligem articulações e faz doer as próteses nos ossos. E, invariavelmente, começa e termina com uma onda de resfriados, cinco dias de desconforto para cada pessoa, duas vezes ao ano.

O verão do avesso cancela todos os eventos ao ar livre programados para a tarde, desde o churrasco do almoço de domingo até o show de multidões. Às vezes, cancela também os da manhã e os da noite, principalmente em fevereiro. Só não cancela o carnaval: as bebidas ditas “espirituosas” – destilados, naturalmente – cancelam a chuva.

Senhoras e senhores, nosso inverno, o verão do avesso, chegou.

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