quarta-feira, 7 de maio de 2008

Pasmem!

A alma se renova quando a gente se depara com um escritor como Ohan Pamuk. Foi preciso que ele recebesse o Nobel, em 2006, para que traduzissem seus livros e a gente o descobrisse, dois anos depois. “Meu nome em vermelho” é um arabesco: “...essas formas em conjunto, (que) constituem um padrão infinto que se estende para além do mundo visível e material”. É pura arte islâmica, com as técnicas do século XX, o que nos torna mais compreensível o que diz. Ao mesmo tempo, é a arte atemporal da literatura, a arte universal das letras:

“... o tremor nervoso dos caracteres traçados com cólera por minha amada, a progressão das curvas que, da direita para a esquerda, se contorcem e se ligam para melhor urdir seus enganos.”

“É o mais longe a que se pode chegar na pintura, é ver o que aparece na própria escuridão de Alá”.

“... o homem, qualquer que seja o seu amor, sempre acaba esquecendo um rosto que fica muito tempo sem ver.”

“Ao tentar pintar o cavalo perfeito (o pintor) revela seu amor à riqueza deste mundo e a seu criador, utilizando as cores da paixão pela vida. Somente isso e nada mais.”

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Mas Pamuk se torna um oásis secreto, quando a gente entra no Banco do Brasil. Agora, uma máquina distribui as senhas: você é classificado pelo saldo médio. Baixa renda: suba escadas e entre na fila. Aos poucos, que o espaço é pequeno. Dois atendentes, que você tem mais é que esperar. Alta renda: quatro atendentes, conforto e rapidez. Pior: na senha do baixa-renda está escrito: “atendimento preferencial”...

E mais distante fica ainda este oásis quando você assiste um júri absolver o mandante de um assassinato, que obviamente fez um acordo com o pistoleiro para se safar da condenação. Onde colocar a revolta? Em baixo do tapete, principalmente agora que uma medida provisória legaliza praticamente toda a grilagem de terras na Região Norte, aumentando para 1.500 hectares a legalização de posses ocupadas. Sojeiros, sudanzeiros, madeireiros, festejai! E os demais, que pasmem!