sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Meta número um


Leio nos jornais que a Previdência está-se aparelhando, há oito anos, para cumprir sua meta número um: combater as fraudes e a corrupção.

A noite caiu na minha’alma. / Fiquei triste sem querer./ Uma sombra veio vindo/ veio vindo e me abraçou... – como disse uma vez Carlos Drummond de Andrade.

Pois que a meta número um não pode, não deve ser essa. E porque essa meta está descolada do resto, não entendem essas pessoas que mandam há tanto tempo na Previdência que fraude e corrupção são derivadas, não são premissas. São consequência do mau serviço, da ideologia de Estado, que não vê o cliente, mas apenas a si mesmo.

Por exemplo: todas as empresas são obrigadas a entregar ao empregado o contracheque, a discriminação dos valores que compõem a remuneração. A Previdência não entrega. Você recebe, quando recebe, um tal de “extrato” de benefício. Nem tente reclamar – não há resposta. A Previdência confessa dívidas e não paga, manda para a Justiça porque sabe que, qualquer que seja o valor, vai durar anos para decidir, e ela não pagará a atualização monetária integral; não disponibiliza perícias, principalmente para os incapacitados por Alzheimer e Parkinson; não verifica absolutamente nada.

Imersos na enorme papelada, submersos na burocracia, os funcionários trabalham, na verdade, num enorme cartório. Pensa que o computador eliminou o carimbo? Engano seu. Ele continua lá, firme e forte. Mas o cliente pode receber tiras de impresso automático, impossíveis de serem lidas e entendidas.

Além disso, o grande golpe previdenciário é dado pela remuneração paga aos bancos para que eles controlem o dinheiro do aposentado. É aí o maior vazamento da Previdência – pagamentos por pessoa atendida, com a vantagem do crédito consignado, que não tem riscos mas tem juros altos, que, agora, os bancos estão achando pouco.

Mas a Previdência não está isolada. A ideologia de Estado preside o Brasil. A evolução salarial dos servidores públicos mostra isso: são as categorias repressivas as que ganham mais. Fiscalização, polícia, tribunais e derivados: Procuradoria, Advocacia, Ouvidoria, Controladoria... Compare a remuneração de um professor ou médico com a de um desses togados ou fardados. E depois vêm-me dizer que saúde e educação é que interessam...

O escandaloso, na Previdência, é que ela não cumpre absolutamente nada dos deveres exigidos para qualquer mortal neste país. Está acima do bem e do mal, paira acima da lei (e por isso está fora dela). Como pode falar em combater fraude e corrupção, se é a primeira a descumprir tudo o que propõe?

Eu gostaria muito de saber quantos foram eliminados injustamente no último recadastramento, e voltaram a receber. Desconfio que são a maioria dos cadastros cancelados, porque há milhares de pessoas que vivem em locais remotos ou cujos documentos não estão em dia. Mas essa informação eu jamais conseguirei: a Previdência só diz o que quer, e isso ela não quer dizer.

É uma sombra – que nos rouba a alegria.