quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Vergonha!

O que aconteceu na Grande Belém, no dia 5 de outubro, a quando das eleições municipais, é uma vergonha.
E não adianta os tribunais eleitorais e o Ministério Público fazerem de conta que tudo está bem. A população sabe. A população viu. A população sentiu.
Cerca de trinta mil eleitores foram objetivamente impedidos de votar em Belém, e alguns outros milhares em Ananindeua; e se eu digo “objetivamente impedidos”, não estou exagerando. Urnas que deviam ser substituídas, não o foram; e não havia cédulas para a votação manual.
É ridículo dizer-se que os resultados estão dentro da normalidade: não estão. Basta conferir a abstenção havida nas eleições, desde 2000: em todas as votações, ela fica muito longe dos 19% registrados nesta.
Choro de perdedor? Não, nada disso. Eu não estive na campanha, não apoiei qualquer candidato. Mas reclamo em memória dos que sofreram, morreram, foram exilados, humilhados, perseguidos para defender o direito do eleitor de escolher seus representantes; para defender a liberdade de julgamento no Judiciário, a dignidade da toga. Não é tanto tempo assim: ainda não se passaram 50 anos que Herzog morria na cadeia, Ulisses Guimarães era humilhado em público, Juscelino e Jango morriam em acidentes suspeitos, Teotônio Vilela percorria o país pedindo liberdade.
O que aconteceu em Belém ofende a memória destes homens.
Sabem os juízes e procuradores eleitorais, tão bem quanto eu, que trinta mil votos em Belém alteram a composição da Câmara de Vereadores. Sabem que as diferenças entre os candidatos foram pequenas demais, para que se desconsidere a quantidade de eleitores impedidos. Sabem que a eleição está sob suspeita.
Não adianta dizer que “foi o sistema”. O sistema que fez isso não é o de informática, o programado nos computadores. O sistema que fez isso é o mesmo que mantém a impunidade, é o mesmo que só fiscaliza os adversários, é o mesmo não viu uma garota presa entre homens em Abaetetuba, dias e dias a fio.
Esse sistema tenta convencer que a urna eletrônica é inviolável e que todos aqueles que a manipulam estão acima de qualquer suspeita. Tenta convencer, aliás, que todos os que organizam e executam o processo eleitoral estão isentos de qualquer paixão, inclusive da cobiça. Que os resultados são puros, isentos, livres.
Seriam – se não fosse o fato de que cerca de trinta mil eleitores não tiveram meios nem maneira de expressar sua escolha em Belém. Seriam – se não fossem as centenas de milhares de testemunhos sobre as condições de funcionamento das urnas eletrônicas, das trocas de disquete no meio da votação, das recomendações dos mesários dizendo ao povo que fosse para casa, às vezes até de maneira desaforada e direta. Seriam – se as urnas tivessem sido testadas, se tivessem sido conferidas, se a eleição tivesse sido preparada corretamente, com todo o respeito ao eleitor, à democracia, e àqueles que lutaram, sofreram e morreram para que esta eleição acontecesse.
É possível até que o resultado da majoritária não fosse alterado, se todos os que deveriam votar, votassem. Mas não se pode dizer o mesmo da eleição proporcional. A bagunça, fortuita ou não, acidental ou não, coloca em dúvida a legitimidade do mandato de todos os vereadores de Belém e Ananindeua.
E nos envergonha.
Uma vez, o ex-prefeito de Belém, Lopo de Castro, me disse que a oposição fazia campanha no Pará, nas décadas de 940, 950, com porretes de maçaranduba, para garantir a inviolabilidade das urnas, tanto quanto possível. A oposição terá que voltar a eles?