terça-feira, 10 de setembro de 2013

A diplomacia em xeque

Parece que a rede mundial de computadores também deixou de cabeça para baixo o mundo diplomático. Nestas duas últimas semanas, o Itamarati foi posto em xeque duas vezes e a Síria faz o mesmo, mas com o mundo todo.
O primeiro caso é o de Eduardo Sabóia. Uma coisa esquisita, opaca, difícil de engolir. Como a diplomacia é um universo muito pouco transparente, talvez que por lá a coisa se explique. Sabóia alegou razões humanitárias, o que, provavelmente, é verdade (ele é católico praticante e a religião praticada explica muita coisa). Mas não dá para acreditar que um encarregado de negócios consiga manter um sigilo absoluto sobre uma operação complicada, envolvendo mais de uma dúzia de pessoas e, sobretudo, o pessoal da Embaixada – seus adidos e seus arapongas. Impossível a informação não ter chegado ao Itamarati, e é isso que torna tudo muito esquisito. Mais esquisito ainda foi a Bolívia ter absorvido tão bem o episódio, aceitando a saída do ministro brasileiro como reparação suficiente. O Itamarati falou de quebra de hierarquia (o que me fez rir, porque não havia nenhuma ordem terminante para o encarregado) e a presidente, de por em risco a vida do asilado (também me fez rir, porque para um sujeito que está no tudo ou nada, é melhor correr risco agindo do que parado). Mas há alguma coisa que não foi dita. Uma operação boliviana de sequestro de Molina, por exemplo?
O segundo caso é o da espionagem americana. Dá vontade de dizer: Cruzes, como nossos diplomatas são ingênuos e desinformados! O problema da presidente é que eles não são assim – a diplomacia brasileira é considerada, no mundo inteiro, como hábil e competente e os países não costumam subestimá-la. Então ninguém sabia dessa história divulgada agora? Ora, durante os 50 anos da Guerra Fria tanto os serviços secretos como os diplomáticos do Brasil e dos Estados Unidos atuaram em conjunto. Evidentemente que cada qual tinha sua zona de reserva, mas o entrelaçamento de atividades nesse período foi grande demais para que tenha sido eliminado. Bem, o assunto foi para a rua. O primeiro problema da presidente é como manter incólume o fluxo de informações que vem do Norte, do qual se beneficiam, entre outras, a Petrobrás. Uma retaliação nessa área é a última coisa que a diplomacia brasileira quer. A reação é para brasileiro ver – mas é preciso que haja, para manter de pé valores antigos, como a independência. No Brasil, onde grampo telefônico é o principal instrumento de investigação policial, hackeragem na internet bate recordes mundiais de ocorrências e se oferecem alguns milhares de artigos de espionagem (escuta clandestina, câmeras de infravermelho e que tais) todos os dias pelo comércio eletrônico, saber da espionagem americana foi o mesmo que constatar que o sol brilha. Porque a rede mundial de computadores tornou as pessoas públicas absolutamente públicas, da medida do pé ao tamanho do fio de cabelo. E está derrubando as velhas fórmulas diplomáticas de forma arrasadora.
Como está acontecendo na Síria. O malfadado ataque químico foi esclarecido em menos de três dias. Difícil aceitar que um ser humano, médico oftalmologista pós-graduado em Londres, mande atirar um inferno de gás venenoso sobre seus compatriotas, mas este ser existe e é Bashar al-Assad. Ele literalmente herdou o governo sírio de seu pai; e está destroçando o país. A velocidade com que se esclareceu o ataque forçou os diplomatas dos países mais poderosos do mundo a correr: desta vez, não houve troca de notas. As negociações, por telefone, pela internet, em terminais próximos ou remotos inauguram um novo fazer diplomático: cara a cara, e rápido.
Xeque na diplomacia tradicional. Talvez até txeque mate.