segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Dias de vergonha

Houve quem festejasse e houve quem protestasse. Talvez até tenha sido coincidência mas a prisão dos condenados do mensalão exatamente no feriadão da República me cheira a uma jogada ensaiada, uma cartada de marketing. A história toda me enche de vergonha, aquela vergonha que a pessoa sente pelos outros que cometem conscientemente deslizes. O constrangimento.
Eu não tenho dúvidas das culpas apuradas. Duvidar disso seria, antes de mais nada, desmoralizar todas as instituições nacionais. Mas me pergunto sobre as culpas não apuradas, também ligadas a esse escândalo. Tenho a impressão de que o processo foi cuidadosamente conduzido para entregar alguns e poupar outros. E pegar de jeito o denunciante.
Vejo, pela tevê, os condenados pedirem e conseguirem em parte um tratamento especial. A patética declaração de Genoíno de que é preso político, julgado em tribunal de exceção. Sinceramente, eu lamento por este homem, por seu passado e sua coragem. Mas ele não soube resistir ao poder e foi traído por si mesmo, pela crença que “a causa” era mais importante que tudo. A antiga justificativa de todas as guerras, de que os meios justificam os fins, sempre faz muitas vítimas.
Diante do tratamento habitual que a polícia dá aos presos e da superlotação dos sistemas penais, tenho vergonha de ouvir o presidente do Supremo recomendar respeito aos direitos dos presos e de um diretor de presídio se apressar em negar que um preso dormiu num colchonete no chão. Lembro um trecho do “Cachimbo da Paz”, de Gabriel, o pensador, e sinto mais vergonha ainda.
É com constrangimento que me pergunto quem paga a conta do exército de advogados que atende os réus. E é com vergonha que assisto o mais alto tribunal do país negar os últimos recursos, dizendo que são meramente protelatórios, feitos para adiar o cumprimento da sentença – e não punir ninguém pela má-fé, quando a má-fé em juízo é capitulada em lei.
Tenho vergonha em saber que aqueles que receberam a mensalidade clandestina para trair seus eleitores e a consciência pública foram reeleitos. E que alguns dos réus condenados continuam traficando influência, assinando contratos cujo valor e abrangência só podem se referir a mais corrupção. Sinto vergonha em ver parlamentares condenados nesse processo continuarem exercendo mandatos.
Espero apenas que toda esta vergonha que sinto seja resgatada, o que só acontecerá se esse julgamento tiver sido, de fato, o primeiro de uma longa série. Que marque uma pacífica depuração do sistema político brasileiro. Eu sei que é um sonho, isso, mas se não tivermos alguma utopia que nos leve adiante, naufragamos.